POR MERCÊ DE DEUS E DA SANTA SÉ APOSTÓLICA
BISPO TITULAR DE ACUFIDA
BISPO AUXILIAR PARA A ARQUIDIOCESE PRIMAZ DE SÃO JOÃO DEL CREEPER
Queridos irmãos e irmãs,
O Evangelho de hoje nos conduz ao coração da misericórdia de Jesus. Ele não apenas nos revela o que Deus pensa sobre o pecado, mas também como Ele olha para o pecador. A cena é densa, carregada de tensão, de julgamento, de armadilhas. No centro dela, uma mulher acusada, cercada de pedras e de olhares que não querem restaurar, mas punir. E ali, no meio de tudo isso, está Jesus.
Vamos refletir sobre três aspectos desta cena tão humana e tão divina ao mesmo tempo: a frieza dos acusadores, o silêncio de Jesus e a dignidade restaurada da mulher.
1. ponto
Os mestres da Lei e os fariseus trazem uma mulher em flagrante adultério. Eles não estão realmente interessados na justiça ou na Lei. O que querem é usar aquela mulher como uma armadilha para Jesus. Ela se torna um objeto, um meio para um fim. Isso já diz muito.
Quando o outro deixa de ser pessoa e se torna “caso”, “escândalo”, “prova contra alguém”, algo está profundamente errado. Quantas vezes em nossas comunidades também agimos assim? Alguém erra — e ao invés de acolhermos, apontamos. Às vezes com palavras, às vezes com o silêncio e o afastamento. Tornamos o erro do outro uma forma de afirmar a nossa suposta retidão.
Mas não é esse o caminho de Deus. A frieza dos acusadores contrasta com o olhar misericordioso de Jesus. Os que carregam pedras nas mãos não perceberam que carregavam também as suas próprias culpas. E Jesus os convida a se verem com sinceridade: “Quem não tiver pecado, atire a primeira pedra.”
2. Ponto
Diante da pressão, da violência da cena, Jesus não responde de imediato. Ele se inclina e escreve no chão. E ali, no silêncio, Ele desconcerta. Não é fuga, é sabedoria. É o silêncio de quem não entra no jogo do ódio, mas propõe uma nova lógica: a da consciência, do coração tocado.
Esse gesto nos ensina muito. Em tempos de julgamentos rápidos, de respostas apressadas, de condenações feitas com base em boatos e manchetes, o gesto de Jesus nos convida a uma pausa. Antes de julgar, é preciso olhar para dentro.
Jesus não aprova o pecado, mas Ele também não compactua com o espírito de morte. Ele cria um espaço de encontro, onde a verdade pode ser dita sem que destrua. Um espaço onde a misericórdia possa agir.
3. Ponto
Quando todos se vão, Jesus e a mulher permanecem. Ela, antes cercada por homens prontos a apedrejá-la, agora está diante daquele que poderia, com justiça, julgá-la. Mas Ele escolhe outro caminho: “Eu também não te condeno. Vai, e não peques mais.”
Não há discurso, não há humilhação, não há exposição pública. Há uma palavra firme e libertadora. Jesus não diminui a gravidade do pecado, mas devolve à mulher algo que ninguém mais naquela cena parecia querer dar: sua dignidade.
Esse é o estilo de Deus: não apagar o pavio que ainda fumega, não esmagar a cana já quebrada. Ao contrário do mundo, Deus não nos define por nossos erros, mas pela possibilidade de recomeço.
Quantos entre nós também carregam culpas, arrependimentos, feridas antigas. E às vezes pensamos que Deus é como os acusadores: pronto a castigar. Mas hoje o Evangelho nos mostra que Deus não nos condena, Ele nos levanta.
Conclusão
Irmãos e irmãs, a Quaresma é tempo de conversão, sim — mas conversão que nasce do encontro com a misericórdia. Não mudamos porque fomos pressionados, mas porque fomos amados.
Que neste tempo que nos resta até a Páscoa, possamos deixar as pedras de lado, silenciar diante do mistério do outro e acolher em nós o mesmo olhar que Jesus teve para com aquela mulher.
Não é tarde para recomeçar. A cada um de nós, hoje, o Senhor diz: “Eu também não te condeno. Vai, e não peques mais.”

 
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